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Fusões e aquisições: o que o contador precisa saber para auxiliar o cliente – parte II

Chegamos até aqui, vamos pensar melhor!”

“Mas 80 virou 22, assim eu não vendo…”

“Chegamos até aqui, vamos pensar melhor!”

“Se você quiser, entrega a sua parte de graça; eu não vendo a minha nesses termos”

“Sou minoritário: ou os caras compram tudo, ou compram nada…”

Se mal conduzido, ou sob desalinhadas expectativas, o M&A pode se transformar em briga de sócios.

No primeiro artigo dessa série tratamos dos benefícios para a rotina dos negócios ao se conhecer os procedimentos, conceitos e regras que envolvem as operações de fusões e aquisições (M&A na sigla em inglês).

Falamos que em cada etapa do processo há um aprendizado, e dividimos essas etapas da seguinte forma: (i) aproximação, (ii) definição do valor alvo (valuation), (iii) formalização do memorando de entendimentos (MoU, na sigla em inglês), (iv) auditoria (due diligence), (v) definição do valor do negócio, contingências, garantias etc., e (vi) assinatura dos contratos de compra e venda e demais documentos auxiliares (business agreement, compra e venda de ações/quotas, acordo de acionistas/quotistas, contratos de prestação de serviço etc.).

Nesse artigo vamos começamos a tratar das etapas acima no processo de M&A, e como isso pode ajudar aos que querem, e aos que não querem vender o seu negócio.

(i) Aproximação

Encontrar alvos sempre é mais fácil do que encontrar compradores. Os compradores miram os concorrentes. Raramente alguém – pessoa física ou jurídica – adquire um negócio que não conhece. Oportunidades estão mais claras dentro do seu core business.

Até porque, ao se adquirir um concorrente, sinergias são somadas, abre-se a possibilidade de eliminação de redundâncias (para quê dois departamentos de RH, dois departamentos financeiros, dois departamentos jurídicos etc.?). Se a empresa adquirida tinha uma rentabilidade de 10%, aquele mesmo faturamento, agora no grupo da empresa adquirente, trará uma rentabilidade muito maior em razão da eliminação de despesas duplicadas, sobretudo despesas administrativas, custos fixos e custos indiretos.
Assim, se alguém quer vender o seu negócio, a dica é procurar os concorrentes.

Claro que procurar o comprador abertamente pode ser ruim para o negócio. O mercado vai saber que tem ali um vendedor, e isso pode impactar estratégias de vendas, de expansão, dentre outras. Se o concorrente sabe da intenção vendedora de alguém, pode intensificar uma campanha nos clientes daquele, tentar enfraquecê-lo, ou mesmo imaginar que exista alguma fragilidade (graças à intenção de venda) a ser explorada.
Não necessariamente a intenção vendedora é fruto de fragilidades, mas sempre será um movimento estratégico: e revelar movimentos estratégicos para concorrentes ninguém quer.

Daí que se deve buscar compradores entre os concorrentes de forma indireta, através de terceiros. Há empresas especializadas nesse trabalho. Elas conduzirão conversas preliminares, divulgarão algumas informações, tudo sem revelar a parte vendedora. Somente o farão quando identificado um interesse avançado no negócio, quando se parte para a próxima fase: a indicação de valor do ativo negociado.

(ii) Valuation

Valuation é o preço do negócio, o valor da empresa, e por isso, deve ser feito pelo vendedor antes mesmo da fase de aproximação.

Uma primeira ideia do preço do negócio pode ser obtida olhando-se o balanço. O total dos ativos, menos o total de dívidas, indica o patrimônio líquido, ou seja, o valor patrimonial que sobra depois de descontados os valores de terceiros. Esse é o valor contábil da empresa.

Mas o valor contábil está muito longe de expressar o quanto, de fato vale uma empresa. Isso porque no balanço não estão contabilizados bens, habilidades, e propriedades da empresa que valem dinheiro: valor da marca, força de vendas, mercado consumidor, fatia de mercado (market share), capilaridade de atendimento, equipe treinada e motivada (capital humano), vendedores vitoriosos, potencial de geração de caixa, e mais um infindável rol de bens não contabilizáveis.

Por isso, os métodos comumente utilizados para calcular esse valor são o fluxo de caixa descontado, e o múltiplo de EBITDA (geração de caixa).
Enquanto o comprador faz o seu valuation antes de pensar em vender, o comprador, naturalmente, somente pode fazê-lo após a fase de aproximação, quando lhe foi despertado o interesse na aquisição, e informações sobre a empresa vendedora lhe foram fornecidas.
Raramente os valores obtidos pelo vendedor e pelo comprador são idênticos, mas também não podem estar muito longe um do outro, sob pena de o negócio parar nessa fase. Se um quer 1000 e outro só paga 10, não tem nem conversa.

Alinhadas então as partes quanto ao valor do negócio – uma estimativa apenas, ainda a ser confirmada pelas próximas fases –, assina-se o MoU.

(iii) Memorando de entendimentos (MoU)

Se um quer vender, outro quer comprar, e estão de acordo quanto à faixa de preço, falta apenas a avaliação mais próxima do comprador quanto às condições da empresa vendedora, para uma definição final e acertada do preço, condições de pagamento, garantias de parte a parte etc.

Mas antes de seguir, e considerando que informações sensíveis serão trocadas por um longo tempo, em um processo que pode não resultar em fechamento do negócio – afinal, até a assinatura do contrato de compra e venda, qualquer das partes pode desistir –, torna-se prudente assinar um memorando de entendimentos (MoU na sigla em inglês) antes de dar sequência.

Trata-se de documento onde as partes externam a intenção de fechar o negócio (ainda que de forma não vinculante), já definem um preço alvo, pactuam um compromisso de confidencialidade, definem parâmetros a serem utilizados na formação final do preço, indicam as responsabilidades do vendedor e do comprador quanto a passivos e ativos específicos, acertam os procedimentos de auditoria, dentre outros pactos.

Esse documento pode receber diversos outros nomes, tais como “Carta de Intenções” ou “Termo de interesse”. O nome em si pouco importa. O conteúdo, no entanto, segue sempre a linha acima, com um objetivo de regular as ações seguintes, e demonstrar um claro interesse das partes quanto ao objetivo comum.

Como dito, interesse é não vinculante, e qualquer parte pode desistir no caminho. Contudo, uma desistência imotivada pode caracterizar má-fé, e gerar um processo judicial. Não é à toa que as partes firam o interesse inicial: vão investir dinheiro, tempo e energia no processo. Assim, uma desistência fundamentada (discordância quanto a cláusulas contratuais, preço, ou outro ponto da negociação) é admitida; uma desistência sem motivo, não se admite.

Por essa razão o MoU deve ser muito bem pensado. A discordância posterior de algo já previamente aceito no memorando pode caracterizar má-fé. No mínimo, vai dificultar o andamento da negociação.

No próximo artigo, fechamos a série com os comentários sobre as seguintes etapas: (iv) Due diligence, (v) Definição do valor do negócio, contingências, garantias etc, (vi) Fechamento com assinatura dos contratos.

*Marco Aurélio Medeiros (marco@msaonline.adv.br) é advogado pós-graduado em Direto da Economia e da Empresa e em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas – FGV e Mestre em Contabilidade Tributária pela FUCAPE/RJ. Ex-professor de Direito Empresarial da Universidade Estácio de Sá e ex-auditor do Tribunal de Justiça Desportiva do Rio de Janeiro. É sócio da MSA Advogados e atua nas áreas de planejamento tributário e empresarial.

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